Preços de Transferência na Dinamarca: pontos-chave sobre a avaliação de intangíveis

dezembro 15, 2025

O caso Dinamarca vs Global Services A/S, resolvido pelo Tribunal Fiscal Nacional da Dinamarca em dezembro de 2025, constitui um precedente relevante em matéria de preços de transferência, especialmente no que se refere à avaliação de ativos intangíveis em reorganizações intragrupo e ao uso do método de fluxos de caixa descontados (DCF). 

A decisão fornece critérios técnicos de alto valor prático para grupos multinacionais que realizam transferências de intangíveis, reestruturações de negócios ou cisões (ou seja, a segregação ou cisão de uma parte do negócio para sua reorganização ou transferência dentro do grupo) e enfoca um aspecto frequentemente subestimado: a determinação correta do retorno das funções rotineiras em relação ao retorno residual atribuível aos intangíveis. 

Este artigo analisa em profundidade os fatos do caso, os conceitos técnicos subjacentes e as principais lições que as empresas devem considerar do ponto de vista da conformidade e gestão de riscos em preços de transferência. 

Antecedentes do caso 

A Global Services A/S, uma entidade dinamarquesa pertencente a um grupo multinacional, participou de uma reorganização intragrupo que envolveu a transferência de ativos intangíveis para outra entidade do grupo. 

Para determinar o valor desses intangíveis, a empresa preparou dois relatórios de avaliação com base no método DCF, seguindo uma abordagem comum em transações comparáveis entre partes independentes: 

  1. O valor total do negócio foi estimado a partir dos fluxos de caixa futuros esperados. 
  2. Foram identificadas as funções rotineiras que permaneceriam na entidade transferente. 
  3. Foi atribuído um retorno a essas funções rotineiras. 
  4. O valor residual resultante foi atribuído aos intangíveis transferidos. 

A controvérsia surgiu quando a Administração Tributária dinamarquesa questionou a forma como a empresa havia determinado o retorno aplicável às funções rotineiras. 

O cerne do conflito: retorno das funções rotineiras vs. retorno residual 

avaliação de intangíveis

O que são funções rotineiras? 

Em preços de transferência, as funções rotineiras são aquelas atividades de baixo risco e baixa complexidade — por exemplo, serviços administrativos, suporte operacional ou fabricação sob encomenda — que, sob o princípio da plena concorrência, geralmente recebem retornos estáveis e relativamente baixos. 

Essas funções se diferenciam das funções DEMPE (Development, Enhancement, Maintenance, Protection and Exploitation), que são aquelas que geram e controlam o valor dos intangíveis. 

A abordagem da empresa 

A Global Services A/S atribuiu às funções rotineiras um retorno exigido inferior ao aplicado ao negócio como um todo. Como consequência: 

  • O valor das funções rotineiras aumentou. 
  • O valor residual atribuível aos intangíveis foi reduzido. 

Do ponto de vista fiscal, essa abordagem diminuía a base tributável associada à transferência de intangíveis. 

A posição da autoridade fiscal 

A Administração Tributária sustentou que: 

  • As funções rotineiras não podiam ser avaliadas utilizando um rendimento exigido inferior ao do negócio total. 
  • Ao fazê-lo, gerava-se uma distorção artificial do valor residual, incompatível com o que aceitariam partes independentes em condições de mercado. 

O método DCF e sua correta aplicação em preços de transferência 

Por que se utiliza o DCF na avaliação de intangíveis? 

O método de fluxos de caixa descontados é amplamente utilizado em preços de transferência quando: 

  • Não existem comparáveis externos confiáveis. 
  • São avaliados intangíveis únicos ou altamente integrados. 
  • São analisadas transferências de negócios em andamento. 

O DCF estima o valor atual dos benefícios econômicos futuros, descontando-os a uma taxa que reflete o risco do ativo avaliado. 

O ponto crítico: a taxa de desconto 

Neste caso, o tribunal enfatizou especialmente que: 

  • A taxa de desconto deve ser coerente com o perfil de risco real das funções ou ativos avaliados. 
  • Não é admissível aplicar taxas artificialmente baixas a funções rotineiras quando estas fazem parte integrante do mesmo negócio subjacente. 

O tribunal concluiu que o mesmo rendimento exigido deveria ser aplicado tanto ao negócio total quanto às funções rotineiras, alinhando-se com a abordagem da autoridade fiscal. 

Decisão do Tribunal Fiscal Nacional 

National Tax Tribunal determinou que: 

  • A metodologia da Global Services A/S não cumpria integralmente o princípio da plena concorrência. 
  • A abordagem da autoridade fiscal para a determinação do retorno das funções rotineiras era tecnicamente mais consistente. 

No entanto, o tribunal reduziu parcialmente o ajuste proposto pela autoridade, fixando um ajuste final de aproximadamente DKK 60,3 milhões, o que demonstra que a análise foi técnica e não meramente confirmatória da posição fiscal. 

Implicações práticas para grupos multinacionais 

Este caso deixa várias lições importantes sobre preços de transferência: 

  1. Coerênciainterna nos modelos de avaliação 

Os modelos DCF devem ser internamente consistentes. Diferenciar taxas de retorno sem uma justificativa econômica sólida aumenta significativamente o risco de ajustes. 

  1. Documentaçãorobusta de funções e riscos 

A delimitação precisa das funções rotineiras e das funções DEMPE é crítica. Uma classificação incorreta pode alterar substancialmente a avaliação dos intangíveis. 

  1. Relevâncianas reorganizações intragrupo 

As reorganizações empresariais continuarão a ser um foco prioritário para as administrações tributárias, especialmente quando envolvem intangíveis estratégicos. 

  1. Tendênciapara um maior escrutínio técnico 

O caso confirma uma tendência global: as autoridades fiscais e os tribunais estão analisando em profundidade os pressupostos financeiros utilizados nas avaliações, e não apenas a metodologia declarada. 

Conclusão 

Este caso reforça a importância de aplicar critérios econômicos sólidos e coerentes na avaliação de intangíveis no âmbito dos preços de transferência. 

Além da Dinamarca, a decisão é relevante para qualquer grupo multinacional que utilize modelos DCF em transferências intragrupo, pois evidencia que a alocação incorreta de retornos entre funções rotineiras e intangíveis pode ser questionada com sucesso pelas autoridades fiscais. 

Do ponto de vista da gestão de riscos, este precedente sublinha a necessidade de combinar rigor técnico, alinhamento com o princípio da plena concorrência e documentação exaustiva, elementos indispensáveis num ambiente fiscal cada vez mais exigente. 

O seu grupo está preparado para defender a avaliação dos seus intangíveis? 

No TPC Group, como empresa especializada em preços de transferência, assessoramos grupos multinacionais na avaliação de intangíveis, reorganizações empresariais e operações intragrupo complexas, garantindo o cumprimento do princípio da plena concorrência e uma gestão adequada do risco fiscal. A nossa abordagem baseia-se em análises econômicas sólidas, documentação técnica robusta e experiência em cenários de fiscalização e controvérsia tributária. 

 

Fonte: TPCases

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