As relações econômicas, comerciais e de investimento entre a Europa continental e o Reino Unido tornaram-se mais complexas após o Brexit. Neste contexto, os instrumentos internacionais de tributação proporcionam segurança jurídica, evitam a dupla tributação internacional e impedem a evasão e a elisão fiscais nas transações transfronteiriças.
Portugal e o Reino Unido mantêm laços financeiros, comerciais e empresariais significativos; por isso, o antigo tratado de dupla tributação assinado em 1968 deve se atualizar, pois, já não responde adequadamente aos padrões atuais de transparência fiscal, troca de informações e regulamentação das estruturas empresariais internacionais.
Em resposta ao acima exposto, em setembro de 2025, ambos os estados assinaram um novo acordo de dupla tributação, alinhado com os critérios da OCDE e as tendências recentes do direito tributário internacional. Por outro lado, apesar da sua assinatura oficial, o tratado ainda não entrou em vigor, o que levanta questões significativas para os contribuintes, empresas multinacionais, investidores e assessores fiscais.
Este artigo fornece uma visão geral abrangente do novo tratado, o seu conteúdo essencial, a sua posição jurídica atual, as razões pelas quais ainda não tem efeito legal e as suas principais implicações, incluindo uma referência específica à sua relação com os preços de transferência.
Assinatura do novo acordo e o seu objetivo principal
O novo acordo de dupla tributação entre o Reino Unido e Portugal foi assinado em 15 de setembro de 2025, com o objetivo de:
- Evitar a dupla tributação sobre a renda e os ganhos de capital.
- Prevenir a evasão fiscal e o uso indevido do tratado.
- Estabelecer mecanismos eficazes de cooperação administrativa e troca de informações entre as administrações tributárias de ambos os países.
O tratado substituirá definitivamente o acordo de 1968 quando entrar em vigor, introduzindo regras modernas adaptadas à dinâmica atual dos negócios internacionais.
Por que o tratado ainda não está em vigor?
Embora o acordo já tenha sido assinado, a sua entrada em vigor depende do cumprimento de procedimentos internos obrigatórios em ambos os países. Especificamente:
- Cada estado deve concluir o seu processo de ratificação interna de acordo com a sua legislação nacional.
- Posteriormente, ambos os governos devem trocar formalmente notificações diplomáticas confirmando o cumprimento desses procedimentos.
- Somente após essa troca será publicada oficialmente a data de entrada em vigor.
Até que esses procedimentos sejam concluídos, o tratado permanece legalmente classificado como “não em vigor”.
Implicações práticas
Elas implicam que:
- Não podem aplicar-se ainda os benefícios do novo tratado.
- O tratamento fiscal entre os dois países continua a ser regido pelo acordo de 1968 ou, na sua falta, pela legislação nacional de cada Estado.
- Qualquer planejamento fiscal baseado no novo instrumento seria legalmente prematuro e arriscado.
Principais conteúdos do tratado de 2025
O novo acordo incorpora uma estrutura moderna e tecnicamente robusta. Entre as suas disposições mais relevantes estão:
- Impostos abrangidos: os impostos sobre a renda e sobre os ganhos de capital em ambos os países – incluindo o imposto de renda pessoal e da pessoa jurídica, bem como o imposto sobre ganhos de capital.
- Pessoas sujeitas: residentes de um ou de ambos os estados contratantes, com regras para determinar a residência em casos de dupla residência.
- Benefícios para empresas com estabelecimentos permanentes (EPs): os lucros comerciais com sede num ou outro país estão sujeitos a tributação somente nesse país, a menos que haja um estabelecimento permanente no outro estado, caso em que somente os lucros atribuíveis ao EP podem ser tributados nesse país.
- Regras para empresas associadas: quando as empresas de um país e do outro mantêm relações financeiras e comerciais, e os termos diferem dos de empresas independentes, o estado poderá “ajustar” os lucros atribuíveis, o que impede a transferência artificial de lucros.
- Os mecanismos para eliminar a dupla tributação incluem créditos fiscais, isenções e regras destinadas a impedir a “dupla tributação econômica” ou a dupla tributação da mesma renda e ganhos de capital.
- Regras anti-abuso e “Direito a Benefícios” (Entitlement to Benefits, EoB): para evitar que o tratado seja utilizado por terceiros (não residentes reais) exclusivamente para fins de otimização fiscal (“treaty-shopping”).
- Troca de informações e assistência administrativa na arrecadação de impostos: os estados se comprometem a colaborar na obtenção de informações fiscais e até mesmo na arrecadação de impostos internacionais.
- O acordo regula uma ampla variedade de rendas, rendimentos e lucros obtidos entre Portugal e o Reino Unido, estabelecendo regras específicas para cada categoria. Os tipos de rendas mais relevantes incluem lucros empresariais, dividendos, juros, royalties, ganhos de capital, rendas do trabalho e pensões, rendimentos provenientes de bens imóveis, atividades de transporte internacional e outras formas de rendas que possam surgir nas relações econômicas transfronteiriças.
No conjunto, o acordo representa uma modernização completa em relação ao tratado de 1968, adaptando-se às realidades do investimento internacional, às complexas estruturas corporativas, aos fluxos financeiros transnacionais e aos padrões contemporâneos de transparência fiscal.
Relação do tratado com os preços de transferência
Embora o tratado não seja uma regra específica sobre preços de transferência, ele contém disposições que afetam diretamente essa área, particularmente por meio do artigo sobre empresas associadas e do princípio do comprimento do braço.
Em transações com partes relacionadas estabelecidas em Portugal e no Reino Unido, as administrações tributárias poderão:
- Ajustar os lucros quando os termos acordados não refletirem os valores de mercado.
- Questionar estruturas destinadas a transferir lucros artificialmente entre jurisdições.
- Trocar informações fiscais mais livremente para sustentar fiscalizações conjuntas.
Nesse sentido, o tratado fortalece indiretamente o quadro de conformidade de preços de transferência, elevando os padrões de suporte técnico, documentação e consistência econômica nas transações intragrupo entre ambas as jurisdições.
Impacto nas empresas, investidores e contribuintes
O novo acordo terá implicações significativas para:
- Empresas multinacionais operando em ambos os países.
- Investidores com fluxos de dividendos, juros ou ganhos de capital.
- Indivíduos com dupla residência ou rendas transfronteiriças.
Entre os principais efeitos estão:
- Maior previsibilidade tributária.
- Redução do risco de dupla tributação.
- Aumento dos controles anti-abuso.
- Maior exigência de substância econômica em estruturas internacionais.
Conclusão
O novo acordo de dupla tributação entre o Reino Unido e Portugal representa uma atualização significativa do quadro tributário bilateral, alinhado com os mais recentes padrões fiscais internacionais. Embora ainda não esteja em vigor, a sua simples assinatura antecipa um cenário de maior controle, transparência e cooperação fiscal.
Para grupos empresariais, investidores e residentes que operam em ambas as jurisdições, este tratado exigirá uma revisão abrangente das suas estruturas fiscais, contratos e políticas de preços de transferência, a fim de antecipar um âmbito de fiscalização mais sofisticado e coordenado.
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Fonte: GOV.UK
